[O presente em colapso, a vontade nula, o corpo inerte, as palavras violadas todas descompostas à minha frente, e eu a querer curvar-me sobre mim, desesperada a procurar uma fração de dignidade e a não conseguir. É perigoso entregar o orgulho. Só declara guerra ao ego quem não o entende e nessa ignorância usa a máscara de ser inexpressivo, um ser inexistente que se pensa cheio, cheio de nada. Não é o ego que é suposto enfrentar, mas tão somente esse espectro sórdido, altivo nos seus medos, com que esventramos a alma. O orgulho que habita o homem, quando cresce em sabedoria, tem a profundidade do bem e é fundamento. É muito perigoso entregar o orgulho, sei isso agora. No entanto, nestas divagações, perco-me sempre ao pensar o amor, como se pensasse na ideia de universo, não encontrando a fórmula para um amar sem a doação plena da alma. O amor será sempre o maior risco, o desequilíbrio maior, porém sabemos que é também a única salvação. Um paradoxo que devo pensar depois, noutro tempo, com a devida e saudável distância. Estava cansada, ali, junto à porta. O sofá a uns poucos metros, cheio de passado e futuro, e eu a não conseguir enfrentar os dois com meia dúzia de passos. O telemóvel tocou pela terceira vez e assegurei com as poucas palavras que restavam que estava bem, que tinha chegado bem. Duas horas de estrada, na madrugada, para te devolver aos dias.]



 

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